O Natal é uma festa que
ultrapassou os limites da cristandade. O conhecido “espírito natalino” toma
conta do mundo inteiro nos últimos dias de cada ano. Chineses e africanos,
canadenses e russos, europeus e asiáticos, gente de todas as línguas, povos e
nações param para comprar um presente, contemplar uma árvore iluminada e cantar
“noite feliz”. Muitos destes sequer saberiam dizer quem é o dono da festa. Para
alguns seria um simpático velhinho de barbas brancas que viria mitologicamente
do céu com seu trenó e suas renas para trazer a solução mágica para todos os
problemas: o Papai Noel. Mal imaginam que este personagem foi criado nos
Estados Unidos na metade do século 19 como uma versão comercial de um generoso
bispo do século 4º que viveu na atual Turquia e que costumava dar presentes
para os pobres: São Nicolau.
Qual seria, então o
verdadeiro sentido do natal? Qualquer cristão praticante responderia a esta
pergunta sem pensar duas vezes: celebramos o nascimento do nosso salvador,
Jesus Cristo. Segundo os evangelhos ele nasceu há dois mil anos no seio de uma
família, Maria e José, na cidade de Belém, em um lugar muito simples, uma
estrebaria; foi saudado pelos anjos e recebeu presentes de sábios vindos do
oriente, que chegaram até o lugar do seu nascimento guiados por uma estrela.
Esta cena é retratada todos os anos na cenografia do “presépio”, que teria sido
criado pela primeira vez por São Francisco de Assis no século 13 como um
recurso de catequese popular. Mas sabemos que já nos primórdios do cristianismo
a cena impactava o imaginário dos cristãos e chegou a ser pintada nas
catacumbas de Roma. Mas e o boi e o jumento que aparecem no presépio? Eles não
estão nos evangelhos de Mateus e Lucas que narram a cena! Certamente a sua
origem está no Antigo Testamento em textos como o do profeta Isaías (1,3) que
afirma que até o boi e o burro são capazes de perceber o seu proprietário, mas
o povo de Deus nem sempre reconhece o Messias. Seguindo na mesma linha o
profeta Habacuc situa a manifestação do Messias entre os animais. Alguém
poderia dizer: mas nos presépios originais não havia o pinheiro iluminado. De
onde teria vido esta tradição? Ele surge apenas no século 11 nos teatros
populares europeus que procuravam contar o nascimento de Jesus. Era uma alusão
à árvore do paraíso, carregada de frutos. A forma como conhecemos hoje,
inclusive com neve, surgiu no século 16 na região da Alsácia, entre a Alemanha
e a França. Os frutos foram substituídos por outros ornamentos e a árvore foi
completamente iluminada. É claro que o comércio se encarregou de sofisticar
este símbolo popular. Em 1912, em Boston, nos Estados Unidos, uma grande árvore
de natal foi ornamentada e iluminada em praça pública. Rapidamente o costume se
espalhou por todo o planeta.
Podemos observar que o
Natal é um evento de grande impacto fora das igrejas, nas famílias e nas
praças. Mas dentro das celebrações cristãs oficiais, como teria surgido o
Natal? No início do cristianismo o ano litúrgico era marcado apenas por uma grande
festa: a Páscoa. Seguindo a tradição judaica os cristãos calculavam a sua data
a partir do calendário lunar. Enquanto os judeus comemoravam a libertação do
Egito com a Ceia Pascal, os cristãos celebravam a ressurreição de Jesus, com a
vigília Pascal. Ao terminar esta vigília a aurora era celebrada como a chegada
do “sol nascente a luz do alto que veio nos visitar” (Lc 1, 78). Aos poucos a
páscoa cristã começou a ser preparada por quarenta dias de penitência, a
Quaresma, e depois dela vinham cinquenta dias de espera pela vinda do Espírito
Santo, o Pentecostes. Esta arquitetura do Mistério Pascal celebrado no tempo
cronológico, porém, tinha uma falha. O início do ano era marcado pela Páscoa,
mas o final do ano era habitado por uma série de festas pagãs. Em Roma, por
exemplo, o dia mais longo do inverno, em dezembro, era celebrado em honra ao
“deus sol”. A partir do século 4º o cristianismo começa a dar um sentido
cristão a estas festas do sol, entendendo que Jesus Cristo é o verdadeiro “sol
nascente”. A primeira notícia que temos da celebração do natal cristão no dia
25 de dezembro vem do ano 354, em Roma. Nos anos seguintes esta data começou a
ser celebrada de modo fixo no dia 25 de dezembro pelos cristãos ocidentais e no
oriente no dia 06 de janeiro. Este costume rapidamente foi assimilado também
pelo ocidente e o Natal recebeu, assim como o ciclo pascal, um tempo de
preparação, chamado advento e um tempo de repercussão, chamado “epifania”, que
significa manifestação. Devemos grande parte desta arquitetura do Natal ao Papa
São Leão Magno (440-461) que nos deixou belíssimas homilias natalinas. Este é o
grande teólogo do Natal.
O Natal, portanto, é uma
festa da prece e da praça, da Igreja e da sociedade, dos que creem e dos que
preferem não crer, mas não resistem a cantar o “noite feliz”, render-se ao
espírito natalino e dar um presente para alguém. É uma festa contagiante que
nos coloca em torno de uma criança, que é a nossa salvação. Isto nos enche de
esperança e nos faz parar para pensar. Se a páscoa é a festa da lua, o natal é
a festa do sol. As duas nos resgatam do ritmo cronométrico do relógio e nos
colocam no ritmo humano da natureza. Viver o natal é sair da sofisticação
complicada e assumir a cultura da vida simples e sóbria. O messias no presépio
entre anjos e animais é um grito contra a complicação da vida moderna que
sequestrou nossa felicidade. É tão simples, tão silencioso, tão fácil… parar um
dia e eternizar o natal. Todo dia podemos renascer como faz o sol. O Sol
Nascente, a Luz do Alto nos visitou para dizer que a noite pode ser feliz se
acreditarmos que depois dela, um novo amanhecer virá. O natal, enfim, é a festa
da esperança. Nosso forte e infinito Deus assume fragilidade e a simplicidade
de uma criança. Será necessário cuidar deste menino que será o nosso Salvador.
Este Menino-Deus mora no coração de cada um precisa de cuidados. Até os animais
já perceberam: Deus está no meio de nós. Feliz Natal.
Padre Joãozinho, scj
Fonte: http://blogdopadrejoaozinho.catholicus.org.br/o-verdadeiro-sentido-do-natal/
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