O ano de 2010 será marcado internacionalmente
não apenas pela Copa do Mundo. Outro tema - a biodiversidade - vai
interferir de forma direta e implacável no cotidiano das pessoas, em
escala muito maior e talvez sem a mesma visibilidade na mídia. O assunto
também vai atrair a atenção de muitos países durante a Conferência da
Biodiversidade (COP-10), a ser realizada em outubro em Nagoya (Japão).
Apesar de ainda não ter o mesmo apelo do
futebol nas discussões do dia-a-dia, neste Ano Internacional da
Biodiversidade - estabelecido pela ONU- nações de todo o mundo vão
debater a perda da biodiversidade, prejuízo que afeta não só animais e
plantas (como muitos preferem simplificar a questão), mas interfere de
maneira crucial na manutenção da vida do homem e no equilíbrio de todo o
planeta.
Para se ter uma ideia do tamanho do prejuízo,
as perdas econômicas decorrentes do processo de redução de espécies
alcançam uma cifra anual entre U$2 e US$ 4,5 trilhões, segundo
pesquisadores do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente
(Pnuma).
O encontro no Japão vai reunir as nações
megadiversas (grupo dos 17 países que abrigam a maioria das espécies da
Terra e juntos detêm cerca de 70% de toda a biodiversidade do planeta,
entre eles o Brasil), as principais potências econômicas mundiais e
outros 100 países aproximadamente. O objetivo é tentar encontrar
soluções que possam surtir efeito rápido (ou pelo menos de médio prazo),
a fim de evitar novos colapsos ambientais ao redor do planeta.
Durante a COP-10, o Brasil vai assumir um
protagonismo, pois pretende reafirmar o pacto entre os países
signatários da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), para o
cumprimento das metas estabelecidas tanto na Rio-92 quanto em
Johannesburgo (África do Sul), em 2002.
Vai ainda defender a bandeira da repartição de
benefícios oriundos do patrimônio genético da biodiversidade, principal
ponto pretendido pelos megadiversos na convenção.
Segundo a secretária de Biodiversidades e
Florestas do MMA, Maria Cecília Wey de Brito, muitas reuniões
preparatórias têm sido realizadas pelas 17 nações megadiversas, com o
objetivo de se estabelecer uma proposta comum.
A questão da compensação financeira pelo
conhecimento obtido a partir da biodiversidade, no entanto, é motivo de
controvérsia. Ganhou manchete dos jornais o caso do cupuaçu, que teve um
pedido de patente registrado no exterior por uma empresa japonesa,
apesar de ser uma planta típica da Amazônia.
Por meio da contestação de entidades
ambientalistas nos escritórios de patentes internacionais, foi impedida a
aprovação do registro, pois as aplicações do produto já eram, há muito
tempo, de domínio dos índios e das comunidades tradicionais amazônicas, e
não envolviam nenhum tipo de inovação que justificasse o direito de sua
exploração pela companhia japonesa.
Diversidade global em declínio - De acordo com o
terceiro relatório do Panorama da Biodiversidade Global (GBO3, em
inglês), divulgado no começo de maio pelas Nações Unidas (cuja versão em
português será lançada em 21 de maio pelo MMA), nenhum país cumpriu
integralmente as metas de redução da perda da biodiversidade em seus
territórios entre 2002 e 2010.
O documento é um relatório oficial da Convenção
sobre Diversidade Biológica, estabelecida em 1992, e vai pautar as
discussões entre os chefes de Estado participantes da Cúpula da
Biodiversidade no Japão. O ponto mais preocupante deste estudo revela
que a perda da biodiversidade global está alcançando um patamar quase
irreversível.
Entre 1970 e 2006, por exemplo, o número de
indivíduos de espécies de vertebrados teve um declínio de 30% em todo o
mundo, e a tendência, segundo o GBO3, é de que a redução continue,
especialmente entre animais marinhos e nas regiões tropicais. O
relatório indica ainda que 40% das espécies de aves e 42% dos anfíbios
apresentam população em queda.
Para reverter o quadro de sérios prejuízos
ambientais e econômicos, seriam necessários investimentos em todo o
planeta de aproximadamente U$45 bilhões por ano.
O relatório indica os cinco principais fatores
de pressão sobre a biodiversidade: perda e degradação de habitats
(convertidos em plantações, pastagens, áreas urbanas), mudanças
climáticas, poluição, sobreexploração dos recursos naturais e a presença
de espécies exóticas invasoras. As intervenções humanas em lagos de
água doce também foram apontadas como outro fator importante, pois
devido ao acúmulo de nutrientes, inúmeras espécies de peixes foram
levadas à morte em larga escala.
A acidificação e poluição dos oceanos também
vitimam os recifes de corais, o que descaracteriza o ecossistema
marinho. Nas grandes regiões do mundo, os habitats naturais continuam a
declinar em extensão e integridade, especialmente os bancos de algas
marinhas, as zonas úmidas de água doce, as localidades de água congelada
e os recifes de corais e de mariscos.
Segundo dados da World Conservativon Union
(União Mundial de Conservação), a ação do homem provoca 0,2% da perda
média de espécies todos os anos, que ocorre ainda por queimadas e
desmatamento impulsionados pelo mercado imobiliário e/ou monoculturas de
larga escala, caça e tráfico de animais. Extrativismo sem manejo
adequado e mineração, dentre outros fatores de intervenção antrópica,
também são causas crescentes do processo de extinção, por acompanharem
as necessidades de uma população humana que, segundo estatísticas da
Organização das Nações Unidas, é de 6,5 mil milhões, com perspectivas de
aumento para 7 mil milhões até o ano de 2012.
De acordo com o secretário-executivo da
Convenção sobre Diversidade Biológica, Ahmed Doghlaf, a perda da
biodiversidade ocorre em uma velocidade sem precedentes. "As taxas de
extinção podem estar mil vezes acima das médias históricas", alerta.
Apesar de o GBO3 ressaltar o aumento
considerável das áreas de proteção ambiental (82% estão em áreas
marinhas e 44% em regiões terrestres), e o progresso significativo da
preservação de florestas tropicais e manguezais, dados do documento
revelam que estas medidas não foram suficientes para alcançar a meta
estabelecida.
Ações brasileiras - Há
ainda outros pontos do documento do Pnuma considerados críticos. A
Amazônia é citada como área sujeita a danos irreparáveis, em parte
motivados pelo desmatamento e queimadas, e por outro, pelas mudanças na
dinâmica regional das chuvas e extinção de espécies.
O Brasil é citado como exemplo no que diz
respeito à criação de áreas protegidas (unidades de conservação). Dos
700 mil quilômetros quadrados transformados em áreas de proteção em todo
o mundo, desde 2003, quase três quartos estão em solo brasileiro,
resultado atribuído em grande parte ao Programa de Áreas Protegidas da
Amazônia (Arpa).
Para 2010, já está em fase de análise a criação
de novas áreas protegidas: 3.044.000 hectares no Cerrado; 868.192
hectares no Pantanal; 600 mil hectares no Pampa e mais de 1.200.000
hectares na Mata Atlântica.
Outra estratégia fundamental adotada pelo
Brasil para combater o desmatamento e a extinção de espécies decorrente
desta prática é o monitoramento por satélite de todos os biomas
brasileiros, procedimento que, até 2008, era realizado apenas na
Amazônia e em parte da Mata Atlântica.
Com a identificação e controle das principais
causas do desmatamento na região, em 2009, a devastação da floresta teve
o menor índice (43% mais baixo) dos últimos 20 anos.
Os primeiros resultados sobre o Cerrado e
Caatinga, levantados entre 2002 e 2008, já foram lançados, mostrando que
quase metade da cobertura vegetal original destes biomas já foi
destruída. Para este ano, serão divulgados os dados referentes à
cobertura vegetal do Pantanal, Mata Atlântica e Pampa, referentes ao
mesmo período.
Por meio do monitoramento, é possível
estabelecer planos de ação de fiscalização, controle e combate ao
desmatamento, bem como levar alternativas sustentáveis às regiões onde o
desmate ainda é muito praticado.
Exóticas e invasoras -
Também foi lançada, em 2009, a Estratégia Nacional sobre Espécies
Exóticas Invasoras. O programa vai orientar as diferentes esferas do
Governo a fim de mitigar e prevenir os impactos negativos destas
espécies sobre a população humana, os setores produtivos, o meio
ambiente e a biodiversidade.
Os eixos deste plano são a prevenção da
introdução de novos indivíduos, bem como a mitigação da presença dos
mesmos em biomas e bacias hidrográficas do Brasil. Atualmente, as
invasões biológicas causadas por espécies exóticas invasoras são
consideradas a segunda maior causa de perda da biodiversidade biológica
do planeta, perdendo apenas para a destruição de habitats.
No Brasil, os custos decorrentes dos impactos
causados por estas espécies atingem cerca de U$ 50 bilhões ao ano. Entre
elas, podemos citar o mosquito da dengue, o mexilhão dourado, o caracol
gigante africano, a uva-do-japão, o capim-annoni e o amarelinho.
Também tem sido feita a atualização de listas
de espécies brasileiras ameaçadas de extinção (fauna e flora), que
servem como alerta e instrumento de monitoramento da política de
conservação destas espécies. " O número de espécies em extinção está
aumentando, o que é um sinalizador preocupante, pois demonstra que o
objetivo de reduzir a taxa de extinção não tem sido alcançado", avalia
João de Deus Medeiros, diretor do Departamento de Florestas do MMA.
Fundamentais para a conservação e recuperação
de espécies ameaçadas de extinção (um dos principais compromissos dos
países durante a CDB), estes levantamentos funcionam como instrumentos
de implementação da Política Nacional da Biodiversidade, que inclui as
Listas Nacionais Oficiais de Espécies Ameaçadas de Extinção; os Livros
Vermelhos das Espécies Brasileiras Ameaçadas de Extinção e os Planos de
Ação Nacionais para a Conservação de Espécies Ameaçadas de Extinção.
Evolução da vida - A
biodiversidade é a totalidade das espécies de seres vivos de uma
determinada região ou tempo, e abrange animais, vegetais, fungos e
microorganismos, sendo responsável pela evolução e manutenção da vida em
todos os lugares. Sua manutenção depende do equilíbrio e estabilidade
de ecossistemas, e seu uso e aproveitamento pela humanidade deve,
necessariamente, ser feito de maneira sustentável de forma a
preservá-los.
Desde que o homem começou a interferir na
natureza, a biodiversidade tornou-se a base das atividades agrícolas,
pecuárias, pesqueiras e florestais e, mais recentemente, da indústria de
biotecnologia. Trata-se ainda da fonte primária para remédios,
cosméticos, roupas e alimentos, entre outros produtos, e é essencial
para a criação de grãos mais produtivos e resistentes a pragas e a
outras doenças.
A espécie humana é apenas uma entre 1,75 milhão
de espécies de vida conhecidas. O Pnuma estima que existam pelo menos
14 milhões de espécies vivas ao redor do planeta. Alguns especialistas
calculam que esse número possa chegar a 50 milhões, ou ainda mais.
Extinção de espécies - A
Convenção sobre Biodiversidade foi estabelecida em 1992, durante a
ECO-92, no Rio de Janeiro, mas a meta de redução da perda da
biodiversidade só foi fixada na Cúpula da Terra de Johannesburgo, em
2002. Durante o evento, os governos participantes se comprometeram a
estabelecer medidas para combater a extinção de espécies.
Dentre os pontos acordados constam a redução da
degradação de habitats, o controle de espécies exóticas invasoras (que
ocasionam prejuízos de aproximadamente R $ 2,5 trilhões nas economias de
todo o planeta) e transferência de tecnologia para países em
desenvolvimento. Das 21 metas estabelecidas pela ONU em 2002, nenhuma
está próxima de ser cumprida.
A Convenção sobre Diversidade Biológica foi
assinada por 156 nações - atualmente foi ratificada por 192 - e
estabeleceu que os países têm direito soberano sobre à variedade de vida
contida em seu território, bem como o dever de conservá-la e de
garantir que seu uso seja feito de forma sustentável, isto é,
assegurando sua preservação.
Um dos temas mais defendidos pela CDB é a
necessidade de repartição justa e equitativa dos benefícios derivados do
uso dos recursos genéticos. Eles seriam divididos entre todos os países
e populações cujo conhecimento foi chave para sua utilização. Como
exemplo, comunidades acostumadas a usar plantas de sua região desde
tempos remotos, como os índios.
Fonte: Ministério do Meio Ambiente www.mma.gov.br
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